Você provavelmente já deve ter ouvido e utilizado essa expressão algumas vezes. O complexo de vira-lata, ou vira-latismo, é um termo que designa o sentimento de inferioridade que o brasileiro tem em relação ao resto do mundo.
O verbete foi criado pelo escritor e dramaturgo Nelson Rodrigues, em 1958.
O escritor classificou o sentimento de inferioridade e falta de autoestima dos brasileiros, resultado da derrota da seleção brasileira para o Uruguai, em pleno Maracanã, na Copa do Mundo de 1950, como um complexo de vira-lata.
O vocábulo pegou e ainda é muito utilizado nos dias de hoje.
A seguir mostraremos o contexto em que o termo foi criado, as suas origens e por que o nosso amado vira-lata ainda é visto com tanto preconceito pela sociedade.
Índice
O que é e como surgiu a expressão “complexo de vira-lata”?
A partir da derrota do Brasil para o Uruguai por 2×1 no final da Copa de 50, ainda de acordo com o lendário dramaturgo, o brasileiro passou a ter vergonha de acreditar na seleção brasileira, mesmo que essa possuísse os melhores jogadores do planeta.
Em sua coluna, Nelson Rodrigues apontou essa falta de autoestima, descrédito e sentimento de inferioridade do brasileiro e sinalizou que esse desgosto acompanhava os cidadãos em outras áreas de suas vidas.
O complexo de vira-latas, ou vira-latismo, foi definido pelo escritor da seguinte maneira:
Por “complexo de vira-latas” entendo eu a inferioridade em que o brasileiro se coloca, voluntariamente, em face do resto do mundo. Isto em todos os setores e, sobretudo, no futebol.
[…] Jamais foi tão evidente e, eu diria mesmo, espetacular o nosso vira-latismo. Na já citada vergonha de 50, éramos superiores aos adversários. Além disso, levávamos a vantagem do empate. Pois bem: – e perdemos da maneira mais abjeta.RODRIGUES, Nelson. À sombra das chuteiras imortais. São Paulo: Cia. das Letras, 1993. p.51-52: Complexo de vira-latas.
Para o dramaturgo, o problema não estava relacionado apenas ao futebol.
O inconveniente, mesmo, era a forma como o brasileiro se via e a falta de confiança que sentia em relação a si e ao seu país de forma geral.
Nelson dizia que o brasileiro precisava se convencer de que não era um vira-latas para, então, superar essa falta de autoestima e usufruir de suas qualidades, identidade e dons.
O complexo foi, pelo menos, atenuado ainda em 58, após a goleada da seleção brasileira sob a Suécia na Copa daquele ano.
No entanto, embora o complexo de vira-lata, ou vira-latismo, seja um termo relativamente moderno para explicar esse fenômeno de falta de fé/crença em si mesmo, esse sentimento de inferioridade acompanha o brasileiro desde muito tempo.
As origens do “vira-latismo”
Para o escritor e ensaísta Humberto Mariotti, apenas o investimento em educação poderia ajudar o brasileiro a superar o vira-latismo.
Parte do problema, segundo o escritor, estaria no deslumbramento que o brasileiro passou a sentir em relação à cultura estrangeira, especialmente à francesa até o início da década de XX e, posteriormente, à estadunidense.
Há muitos relatos históricos de que o povo brasileiro era classificado como inferior por conta da miscigenação.
Mistura de raças
Diversas correntes de pensamentos tentavam descobrir a origem dessa “inferioridade” e apontavam para a mistura de raças como a causa mais provável.
Depois, outra corrente de pensamento argumentou que o brasileiro, por morar nos trópicos, estava mais propenso a luxúria e a preguiça.
Essa tese, conhecida como Determinismo Geográfico, argumentava que as grandes civilizações só podiam se desenvolver em clima temperado e, por isso, o brasileiro era “insolente” e “imprestável” por ter crescido num país tropical.
Por outro lado, Roquette-Pinto, médico, professor e pai da radiodifusão no Brasil, acreditava que essa inferioridade era originária da ignorância, e não da miscigenação.
Toda esse “esforço” para tentar justificar nossas características negativas em face a outras nações, seus povos e suas características positivas, acabou contribuindo para a criação e alimentação desse sentimento de inferioridade e autodepreciação que perdura até hoje.
Complexo de inferioridade
No campo científico, o Brasil também sofreu bastante e deixou de ganhar prêmios importantes por conta da sabotagem dos próprios brasileiros.
Esse é o caso de César Lattes e Carlos Chagas, por exemplo.
Este último, à época um dos maiores médicos do mundo, era pra ter ganhado o Nobel de 1921, mas acabou sendo alvo de uma campanha difamatória tão grande por parte de seus colegas conterrâneos que o prêmio acabou não sendo entregue a ninguém.
Apenas no ano de 2007 é que um brasileiro palestrou nos seminários coordenados pela Fundação Nobel.
O Dr Miguel Nicolelis, considerado um dos maiores neurocientistas do mundo, na abertura de sua palestra relembrou a final da Copa do Mundo de 1958, citando a goleada do Brasil contra a Suécia como um evento importante para a retomada da autoestima do brasileiro.
Para o neurocientista, caso o Brasil ganhasse um Nobel, esse fato poderia atenuar o nosso vira-latismo científico.
É difícil prever quando um brasileiro ganhará o Nobel e que importância isso poderá ter para o país. Se redimir nosso complexo de vira-lata científico, terá inestimável valor.
Miguel Nicolelis
E o que o vira-lata tem a ver com isso tudo?
Os cachorros que vivem nas ruas, mais conhecidos como vira-latas, sempre sofreram bastante preconceito.
Por serem resultado da mistura de várias raças, os cães e gatos SRD têm características únicas – e o fato de viverem nas ruas reforça essa visão estereotipada em relação a eles.
Como resultado, o vira-lata passou a ser incorporado à expressões e termos criados para descrever características e comportamentos negativos.
Mas essa realidade está mudando. O vira-lata está, cada vez mais, conquistando o coração dos brasileiros. Na realidade, a maioria dos lares brasileiros contam com animal de estimação sem raça definida.
E as vantagens em ter um vira-lata são várias.
Além de serem muito inteligentes, amigáveis e brincalhões, cães e gatos SRD têm mais facilidade em se adaptar.
Outra vantagem é que existem diversos lares e ONGs onde é possível adotar um vira-lata.
Créditos das imagens: Freepik e Pinterest
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